sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Lições de uma queda

Para os conservadores, a queda do gabinete liberal em 1841 trouxe lições importantes.

A primeira era a importância da coesão política e intelectual do gabinete. Sem ela, qualquer questão administrativa poderia levar à saída do poder. Era preciso comandar por meio de um conjunto harmônico de líderes, irmanados por um projeto e articulados pela divisão de tarefas.

A segunda é que, para vencer eleições, é melhor usar a lei do que a fraude e da violência. Um projeto de poder precisa ser traduzido em um projeto institucional.

A terceira é que com rebeliões não se brinca. Sua dinâmica instável é capaz de produzir problemas a cada momento e que todos os recursos devem ser empregados para limitar tal instabilidade. Crises externas e internas devem ter solução rápida, mesmo que dolorosa.

Quando os saquaremas voltarem ao poder, essas lições serão levadas em conta.

Sobre as causas da queda do gabinete liberal

O triunfo liberal com a decretação da Maioridade foi espantosamente rápido, obra de poucas semanas, mas sua queda viria a exibir o mesmo traço espetacular. A literatura produzida mais tarde pelas lideranças do partido, como Ottoni e Tito Franco, não tinha alternativa senão transferir as responsabilidade para "forças ocultas", como a interferência pessoal do Imperador. O exame de Mello Mattos, contudo, é impiedoso.

Era culpa do Imperador se o ministério, no curso das eleições gerais, "nenhum meio poupou para assegurar o triumfo"? Até mesmo um Aviso do Ministro do Império mandando o corpo de artilharia da Marinha votar na freguesia de Santa Luzia. Ou o aumento do número dos operários do Arsenal. No Maranhão, o número de eleitores era maior que a população da Província. Os liberais sequer negaram o abuso e Antônio Carlos chegou mesmo a afirmar que o governo "tem o direito de intervir no processo eleitoral". Foi o Imperador que mudou a política para o Rio Grande do Sul?

Nesse momento, é um membro do Gabinete, Aureliano, que levanta a questão da demissão do comando militar no Sul, incompatibilizado com o presidente da Província. Os demais ministros não querem demiti-lo, pois seria uma confissão de fracasso, e Aureliano apela ao Imperador. Sentindo que perderia a confiança, Antônio Carlos se adianta e pede demissão. O resto é consequência.

É a divergência interna sobre a política militar e civil para o Rio Grande do Sul que leva à desagregação do gabinete liberal, tal como aconteceria em qualquer regime parlamentarista de governo da época.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Marmelada no Rio Grande do Sul

Quando o gabinete liberal de 23 de julho de 1840 chegou ao poder com a Maioridade, o conflito no Rio Grande do Sul encontrava-se estabilizado militarmente, mas a situação estratégica geral era francamente negativa para os Farrapos. O barão de Caçapava, Francisco José Soares de Sousa Andrea (1781-1858), um militar de longa carreira, nascido em Lisboa, retomara Laguna de Garibaldi em novembro de 1839, impedindo a expansão do movimento. Nomeado presidente da Província e comandante das forças imperiais no Rio Grande do Sul, controlava a capital e as saídas para o mar. Os Farrapos podiam circular livremente pelo interior, mas não tinham mais para onde ir.

Em lugar de enviar dinheiro e cavalos, contudo, o gabinete liberal enviou o deputado Álvares Machado para a presidência da Província em novembro de 1840 com a missão levar uma proposta de paz e conciliação a Bento Gonçalves. Era a tese do Gabinete acerca dos efeitos pacificadores da Maioridade, mas que, no Rio Grande, foi chamada política do "vinho e marmelada": gestos de boa vontade do governo desmoralizados pelo comandante farrapo. Gonçalves logo aproveitou a separação entre o comando político e militar na província para ganhar tempo e apresentar demandas excessivas, sabendo que não seriam atendidas.

Álvares Machado teve ao menos o mérito de rapidamente reconhecer o estratagema de Gonçalves, mas em seguida entrou em conflito com o novo comandante militar da Província, o general João Paulo Barreto. As divergências colocavam em risco a posição militar favorável conquistada pelo barão de Caçapava e se tornariam a razão da queda do Gabinete.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

"Hei de persegui-los até a última extremidade"

Tais foram as palavras de Martim Francisco, ministro da Fazenda do Gabinete de 24 de julho, sobre os ministros do Gabinete conservador que caíra em 1840. O ambiente político de revanche, contudo, não foi capaz de esconder o fracasso político logo na próxima esquina. Em discurso posterior, Paulino comentava a curta vida do Gabinete da Maioridade:

"Quando se tratava aqui nesta Casa e no Senado da maioridade de S.M. o Imperador, dizia-se que não era necessária outra medida para o completo restabelecimento da paz e da ordem em todo o Império. Dizia-se que todos os rebeldes do Sul viriam depor as armas aos pés do trono imperial, que as rebeliões haviam de desaparecer de nosso solo, que tudo seria paz, harmonia e felicidade. Mas o que vimos nós, senhores? A mais amarga de todas as decepções."

terça-feira, 4 de outubro de 2011

"Para os amigos, pão; para os inimigos, pau"

A queda do gabinete liberal em março de 1841 deu origem ao que talvez seja o primeiro mito político brasileiro sobre o funcionamento do Poder Executivo: o chamado imperialismo, a influência secreta do Imperador na queda e ascensão dos partidos. Hoje ainda pode-se ler quase todos os dias sobre a "influência" do governo federal no andamento dos assuntos partidários.

Trata-se de uma mitologia, pois, no caso do Partido Liberal, foram seus líderes os primeiros a fraudar uma eleição para garantir maioria na Câmara. Foram as célebres eleições parlamentares de 13 de outubro de 1840, as eleições do cacete, quando todos os recursos possíveis e imagináveis foram usados para assegurar a vitória. Delas nasceu, por sinal, a diretriz primeira para a ação do Executivo na arena eleitoral no Brasil: "para os amigos, pão; para os inimigos, pau".

Como notou, em 1870, Mello Mattos, os liberais apeados do poder poucos meses depois esqueceram com facilidade os seguidos erros de política que cometeram, como a malfadada oferta de anistia aos Farroupilhas, e a decisão de fraudar as eleições a todo custo, que assustou a Câmara em sessão, ainda dominada por conservadores moderados. Os deputados eleitos a poder de "cacete" jamais tomariam posse.