terça-feira, 24 de maio de 2011

Ensaio de materiais em 1840

Concluídos os parágrafos sobre a organização orçamentária das obras públicas, Paulino, uma vez mais, surpreende pela extensão de sua visão administrativa. Para que a economia e a conveniência das obras sejam conhecidas, é fundamental o estudo dos materiais empregados, em especial sua resistência. Ele nota que, enquanto as madeiras da Europa, da América do Norte e mesmo da Índia, são bem conhecidas e testadas, o mesmo não ocorre no Brasil. Vãos de 80 a 100 palmos são considerados ousados, enquanto na Europa e nos Estados Unidos eles são de 300 a 500 palmos. É preciso, segundo Paulino, testar a resistência das madeiras nacionais e sobretudo vulgarisar essas idéias, chamar sobre elas atenção, e persuadir de sua sua utilidade (pág 63).

Também não fica no plano das palavras. Informa a Assembléia Provincial de que encarregou o engenheiro Pedro Taulois (o mesmo que fará o plano urbanístico de Icaraí) de preparar um plano de investigação sobre a resistência das madeiras nacionais. Sugere mesmo que tais estudos sejam institucionalizados na administração provincial.

Outra condição para isso seria a modificação da organização corrente. O presidente da diretoria de obras públicas ficava pouco tempo no cargo e praticamente não tinha nada a acrescentar ao trabalho dos chefes das seções, todos eles engenheiros. Paulino entende que os chefes de seção deveriam se reunir diretamente com o presidente da Província em sessões, onde seriam discutidos todos os aspectos das obras, com máxima expediência. O arquivo da diretoria, composto de plantas, planos e orçamentos, também deveria ser separado do arquivo da secreteria de governo e ser dirigido por um engenheiro hábil.

As condições correntes, contudo, eram desanimadoras. O pessoal da diretoria de obras públicas permanecia com o mesmo efetivo desde a sessão legislativa passada e o seu presidente, o coronel Conrado Jacob de Niemeyer, pediu demissão com a qual perdeu a província um empregado hábil, de ilibada honra, e de um zelo e actividade que será difícil igualar e ainda mais exceder (pág 66).

sábado, 21 de maio de 2011

"Considerações gerais sobre as obras públicas"

Existe aqui uma seção notável no relatório de 1840. Nas Considerações gerais sobre as obras públicas, Paulino começa a expor a idéias que marcarão sua carreira de tratadista do direito administrativo no Brasil. Nossa legislação, começa em seu estilo inconfudível, não é moderna, nem antiga. As leis modernas não existem; das antigas, nada se aproveita. Nossas obras, por sua vez, são prejudicadas pela dependência de gestores públicos, que não tem preocupação alguma com as despesas (que não o prejudicam...) e tem todo interesse na sua demora, para manter seus vencimentos.

Um bom processo de arrematação depende, contudo, de certas condições bem específicas: (1) boa definição das formalidades que a definem; (2) precisa definição das responsabilidades dos contratantes; (3) orçamentos discriminados; (4) que o preço da obra não seja o único critério da contratação; (5) que seja definida de forma expediente a cobrança de responsabilidades e a oferta de garantias; (6) que os orçamentos admitam flexibilidade e (7) sejam fixadas as regras para a fiscalização do governo. Esta última, por sinal, deverá ser feita por um corpo específico de profissionais: Paulino sugere os aspirantes a engenheiros civis, segundo o modelo francês. Deveria existir, adaptadas às condições brasileiras, exigências para a condição de arrematante.

O foco do problema, segundo Paulino, é sempre o orçamento das obras. A autoridade municipal, sempre pressionada pelas despesas, não provê a remuneração adequada ao empresário; este, por sua vez, não tem uma idéia adequada do custo da obra, por seu despreparo técnico. Quando a lei prevendo a arrematação é finalmente executada, seus valores não são mais realistas e as despesas se revelam maiores; o empresário não consegue realizar a obra.

Obras e empresas privadas

Concluída a descrição das obras públicas conduzidas pelo governo provincial nas quatro seções do território, Paulino apresenta um item novo: "Estradas, pontes e canais construídos por empresas". Sua descrição permite vislumbrar um pequeno universo de contratantes de obras públicas organizados de forma empresarial e não meros arrematantes locais.

Chefiadas por engenheiros civis e militares, essas empresas se responsabilizaram por obras como o canal da Villa de Itaguaí, o canal de Cacimbas, entre o rio Paraíba e a Lagoa de Macabu, a estrada do porto da Piedade e várias pontes sobre rios nas regiões em torno de Campos e de Cabo Frio. A ponte suspensa de metal sobre o canal de Cabo Frio, por sinal, estava com sua construção suspensa até que houvesse uma decisão sobre a sucessão do contrato, após a morte do major Henrique Luiz Bellegarde Niemeyer.

A descrição das pontes na região de Campos deixa claro também que parte da obra seria paga por meio de pedágios cobrados pelo empreiteiro.