segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Uruguai, segundo Machado de Assis

São duas as citações diretas na breve crônica "O Velho Senado", publicada em 1898 na Revista Brasileira:

"Uma só vez ouvi falar a Eusébio de Queirós, e a impressão que me deixou foi viva; era fluente, abundante, claro, sem prejuízo do vigor e da energia. Não foi discurso de ataque, mas de defesa, falou na qualidade de chefe do Partido Conservador, ou papa; Itaboraí, Uruguai, Saião Lobato e outros eram cardeais, e todos formavam o consistório, segundo a célebre definição de Otaviano no Correio Mercantil."


"Mas eis que todas as figuras se atropelam na evocação comum, as de grande peso, como Uruguai, com as de pequeno ou nenhum peso, como o Padre Vasconcelos, senador creio que pela Paraíba, um bom homem que ali achei e morreu pouco depois."

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Sessão em 12 de maio de 1841

Prossegue a discussão sobre o projeto que cria os Tribunais da Relação de Minas Gerais e de São Paulo, mas a oposição liberal continua arrastando o debate para questões políticas. O deputado Carneiro da Cunha, da Paraíba, decide responder, denunciando o uso eleitoral da magistratura pelos liberais. Limpo de Abreu é o alvo indireto, acusado de substituir juízes para vencer eleições. Ottoni defendeu Limpo de Abreu com termos um pouco agressivos e Carneiro da Cunha sugere que pode responder à altura ainda que "não costume dar em homens deitados".

Nesse ponto, Paulino, na condição de ministro da Justiça, comenta as acusações de corrupção judicial feitas por Carneiro da Cunha, somente porque o comportamento de Limpo de Abreu foi questionado ("quisera ser coerente com o procedimento que sempre tive nessa casa, de não tomar-lhe o tempo com discursos inúteis").

As objeções de Limpo de Abreu ao projeto são insustentáveis. Ele foi ministro da Justiça por oito meses e sabe dos problemas da organização judiciária (a lei em vigor era de 1751). Também não vê como a acusação a um juiz seria uma acusação a toda a magistratura: Prouvera a Deus que nessa classe não houvesse um indivíduo que merecesse tal censura (apoiados).

Os problemas do Judiciário são sérios: os jovens saem dos bancos das escolas para tomar assento nos tribunais; não há concursos, nem provas e ocupam um cargo vitalício. A magistratura precisa de prestígio, mas esse prestígio não será garantido com palavras estéreis. Precisa de regras claras para remoções que evitem seu uso político e para as promoções; precisa de uma legislação de responsabilidade.

Nesse ponto, Paulino, examina o argumento clássico brasileiro, que sempre combateu: que só se pode criar Tribunais depois de reformada toda a legislação:

"A nossa legislação devia, portanto, ressentir-se das faltas que acabo de ponderar. Mas porventura dever-se-á todas as vezes que se propor uma reforma de um ou outro ponto dela, apelar para uma reforma geral? Quando poderemos nós vê-la realizada?"

Assim, diz Paulino, não há melhoramentos nem pequenos, nem grandes.

sábado, 31 de dezembro de 2011

11 de maio de 1841

O combate parlamentar começa pouco depois da instalação do gabinete. Na sessão de 11 de maio de 1841, Paulino enfrenta as manobras que querem adiar a votação do projeto criando duas Relações, em Minas Gerais e em São Paulo. Os recursos para a segunda instância, em ambas as províncias, tinham de ir para os tribunais do Rio ou do Nordeste, além disso, como parte dos desembargadores ocupava cargos legislativos, crimes que exigiam quorum elevado ou que permitiam a declaração de impedimento (caso dos crimes de responsabilidade) podiam ficar anos sem julgamento. É evidente, contudo, que a criação de lugares de desembargadores tinha várias repercussões de ordem política.

A oposição alega que o projeto não pode ser votado, pois foi aprovado um pedido de adiamento em 1838 que submetia qualquer discussão da matéria a uma decisão anterior sobre o Código de Processo. O debate entre Paulino e Ottoni é travado em torno de questões técnicas da organização da Justiça, mas o problema é outro. Quando Paulino tenta esclarecer sua posição geral sobre o tema, é interpelado por Andrada Machado, o primeiro ministro recém demitido: Deve fallar sobre o adiamento, aqui ninguém tem privilégios.

A confusão em torno da validade do adiamento de 1838 prossegue quando o presidente da Casa decide: pôs a matéria na Ordem do Dia porque entendeu que não havia adiamento; havendo, submete a questão a voto.

Dizem os Anais: Consultada a Câmara, decide que o adiamento não deve subsistir. Continua a discussão do projeto.

A substância da Reforma

O alvo legislativo do ministério da Justiça era, naturalmente, o projeto de reforma do Código do Processo Criminal, apresentado ainda em 1839 por Vasconcelos e que dormia tranquilamente no Senado. Discutido e aprovado rapidamente na Casa, após a instalação do gabinete Araújo Viana, chegou à Câmara no dia 22 de outubro de 1841, onde teria de enfrentar a oposição liberal. Para esta, bastava impedir a aprovação naquele ano, uma vez que contava com a instalação da legislatura "do cacete", eleita em 1840. Por duas vezes, Paulino defenderá o projeto em plenário.

Lei e Ordem

Instalado como ministro da Justiça, a missão de Paulino, fixada desde o primeiro dia, será resolver o problema da ordem, ou seja, as consequências da perda do monopólio da violência pelo Estado, produzidas pelas reformas liberais das primeiras décadas da Independência. Em nenhum lugar está missão é melhor descrita do que em seu primeiro relatório ministerial, apresentado em 1841, um dos mais famosos textos oficiais da história política do Brasil.

Seu estilo direto, sem ilusões sobre os homens, os fatos espantosos narrados e os termos escolhidos para resumir suas impressões constituem passagem obrigatória para todos os que escrevem sobre os "dois Brasis", teorizam sobre os "sertões", sobre o federalismo brasileiro ou se estendem sobre a "invenção" de alguma coisa, outra mania acadêmica nacional.

Ao longo dos anos, contudo, uma científica censura recaiu sobre essas páginas. São sempre citados os trechos teóricos, as reflexões neo-tocquevilianas espalhadas no texto. Nunca se tem um gosto mais direto sobre o que significavam realmente as "revoltas regenciais", consideradas como eventos hobesianos puros.

Como notam as testemunhas da época, as fantásticas explosões de violência do período nada tinham a ver com as românticas rebeliões de escravos. É a velha violência nacional, praticada ao vivo e a cores, entre membros das elites, seus clientes e apaniguados.

Em memória de Paulino José e em homenagem a seu relatório, segue apenas um trecho, sobre fatos ocorridos em Sergipe, que sequer figura entre as províncias atingidas pelas celebradas "revoltas regenciais":



"A vila da Capella, na comarca da Vila Nova, na província de Sergipe d'el Rey, foi invadida no dia 6 de fevereiro próximo passado por um bando de 60 homens, capitaneados pelo padre Manoel José da Silva Porto, ex-juiz de Direito da mesma comarca, o qual se dirigiu à casa do Juiz de Paz da dita vila, José Alves Pereira, para o assassinar. Procurou este infeliz resistir com algumas pessoas que com ele se achavam, mas tendo os assassinos arrombado as portas com machados e dado uma descarga de fuzilaria, caiu ferido, e foi ainda vivo arrastado para a praça e tendo aí o referido Silva Porto oferecido 100 mil reís para quem o acabasse, rasgou-o um dos assassinos com uma faca, desde o peito até o baixo ventre. A vila ficou imediatamente deserta, retirando-se dela o referido doutor e padre, depois de haver queimado o cartório do Juiz de Paz e roubado 30 armas, que o assassinado conservava em sua casa para armar as escoltas com que policiava o distrito". (págs 15-16).



Igreja do Rosário em Neópolis, Sergipe, a antiga Vila Nova.