sábado, 31 de dezembro de 2011

Lei e Ordem

Instalado como ministro da Justiça, a missão de Paulino, fixada desde o primeiro dia, será resolver o problema da ordem, ou seja, as consequências da perda do monopólio da violência pelo Estado, produzidas pelas reformas liberais das primeiras décadas da Independência. Em nenhum lugar está missão é melhor descrita do que em seu primeiro relatório ministerial, apresentado em 1841, um dos mais famosos textos oficiais da história política do Brasil.

Seu estilo direto, sem ilusões sobre os homens, os fatos espantosos narrados e os termos escolhidos para resumir suas impressões constituem passagem obrigatória para todos os que escrevem sobre os "dois Brasis", teorizam sobre os "sertões", sobre o federalismo brasileiro ou se estendem sobre a "invenção" de alguma coisa, outra mania acadêmica nacional.

Ao longo dos anos, contudo, uma científica censura recaiu sobre essas páginas. São sempre citados os trechos teóricos, as reflexões neo-tocquevilianas espalhadas no texto. Nunca se tem um gosto mais direto sobre o que significavam realmente as "revoltas regenciais", consideradas como eventos hobesianos puros.

Como notam as testemunhas da época, as fantásticas explosões de violência do período nada tinham a ver com as românticas rebeliões de escravos. É a velha violência nacional, praticada ao vivo e a cores, entre membros das elites, seus clientes e apaniguados.

Em memória de Paulino José e em homenagem a seu relatório, segue apenas um trecho, sobre fatos ocorridos em Sergipe, que sequer figura entre as províncias atingidas pelas celebradas "revoltas regenciais":



"A vila da Capella, na comarca da Vila Nova, na província de Sergipe d'el Rey, foi invadida no dia 6 de fevereiro próximo passado por um bando de 60 homens, capitaneados pelo padre Manoel José da Silva Porto, ex-juiz de Direito da mesma comarca, o qual se dirigiu à casa do Juiz de Paz da dita vila, José Alves Pereira, para o assassinar. Procurou este infeliz resistir com algumas pessoas que com ele se achavam, mas tendo os assassinos arrombado as portas com machados e dado uma descarga de fuzilaria, caiu ferido, e foi ainda vivo arrastado para a praça e tendo aí o referido Silva Porto oferecido 100 mil reís para quem o acabasse, rasgou-o um dos assassinos com uma faca, desde o peito até o baixo ventre. A vila ficou imediatamente deserta, retirando-se dela o referido doutor e padre, depois de haver queimado o cartório do Juiz de Paz e roubado 30 armas, que o assassinado conservava em sua casa para armar as escoltas com que policiava o distrito". (págs 15-16).



Igreja do Rosário em Neópolis, Sergipe, a antiga Vila Nova.

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