segunda-feira, 11 de maio de 2009

21 de setembro de 1839: estilo pessoal e orçamento municipal

Deputado na Câmara, Paulino José Soares de Souza defende a retirada de uma emenda de sua autoria, revogando uma exigência implícita imposta à Câmara de Vereadores do Município da Corte - o envio de seu orçamento. Naturalmente, aproveita a ocasião para soltar farpas sobre Montezuma, que debochara do ofício da Câmara, e denunciar a politicagem que tais exigências geravam.

O tema é conhecido, inclusive no Brasil federal: centralizadores não gostam de assembléias provinciais, mas defendem a autonomia municipal. Não é preciso explicar as razões.

"... A exigência dos orçamentos municipais, principalmente pela maneira por que se tem posto em prática, no meu fraco entender, destrói, aniquila o espírito municipal. A que ficam reduzidas as municipalidades se elas não têm o direito de dispor ainda de uma insignificante quantia sem dependência de aprovação de corporações compostas de pessoas quase todas estranhas ao município? Quase todas ignorantes das minuciosas circunstâncias das localidades... " (Anais, Sessão de 21 de setembro de 1839, pág 263).

Ele reconhece que o dispositivo visava evitar malversações, mas nota com brilho uma consequência prática que qualquer cientista político brasileiro saberá familiar:

"... Uma província tem 23 ou 24 municípios e dá 36 deputados provinciais. Quase sempre, atento o nosso sistema de eleições, há 3 ou 4 municípios, e às vezes mais, que não tem deputado algum que neles resida ou deles tenha exato conhecimento. Vêm os orçamentos, umas vezes passam tais e quais os fazem as câmaras, porque, além das informações, não há outras bases para os discutir e então torna-se inútil e ilusório o corretivo que teve em vista a lei, ou são ventilados sem conhecimento de causa e então o tal corretivo é o pior mal possível e as câmaras se vêem nos maiores embaraços para executarem cousas inexeqúíveis ou despropositadas.

Suponhamos, porém, que o município tem na assembléia provincial um ou dois deputados do seu seio. Sendo os únicos que na mesma assembléia têm algum conhecimento das localidades, louvão-se os outros neles. Se são vereadores ou amigos dos vereadores, passa tudo quanto a câmara quer: se pelo contrário, mutilam-se muitas vezes os orçamentos, desgostam-se os vereadores, chamam-se os suplentes, etc. Ora, e é esta medida que se quer estabelecer no municipio da Corte, acabando-se assim com a única verdadeira municipalidade que ainda temos" (id., ibid.).

A última consequência do procedimento era, assim, incluir regimentalmente mais uma discussão compulsória na Câmara dos Deputados: o orçamento do município da Corte. Além de destruir a autonomia municipal e ser ineficaz como instrumento de fiscalização, o procedimento causava um atraso danoso nos negócios públicos:

"Cai uma ponte, uma inundação repentina leva um aterro, é indispensável pronto remédio, que não pode esperar que as quantias necessárias sejam consignadas no orçamento da câmara e que esta venha aqui receber e no Senado a sua aprovação."

Paulino continua verberando a intenção de controlar cada despesa específica do município, enfatizando seus efeitos sobre os gestores públicos locais, reduzidos a meros executores de um orçamento defasado:

"É por motivos semelhantes que nas nossas províncias e em muitos de nossos munícípios não se encontram muitas vezes pessoas que queiram servir os cargos de vereador, de juiz de paz municipal, de chefe de legião, etc, que vão cair em mãos menos dignas. As nossas leis, cercando esses cargos de incômodos e de conflitos, têm dado a alguns muito fracos meios de fazer o bem. Deixemos, porém, essa digressão que levaria longe".

Ou seja, a politicagem faria o resto, trazendo para a Câmara os debates sobre vereadores, fiscais e administradores de obras municipais. Dá mais uma cacetada em Montezuma, o flamejante deputado da Bahia e pede:

"...Posto que não o considere tão criminoso como o deputado pela Bahia o quis figurar, não tomarei tempo o tempo à Câmara com sua análise e defesa. O que eu peço é que não se faça desta questão uma questão de pessoas, que não se confunda a causa dos vereadores, boa ou má, com a causa da municipalidade do Rio de Janeiro (apoiados)".

Deixemos a citação: "As nossas leis, cercando esses cargos de incômodos e de conflitos, têm dado a alguns muito fracos meios de fazer o bem."

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